Tudo pode mudar em 90 minutos. Entre o candidato ao título e a rejeição há apenas algumas semanas de distância. O tempo é curto, a comemoração é breve e a mídia não tolera erros. A magia deu lugar a exaustão, hoje o futebol pode ser tudo, menos “por esporte”.
Essa indústria, que nos engole semanalmente, tem afastado cada vez mais o sentido, construído historicamente, da prática. Não há tempo para secar as lágrimas, menos ainda para lamber as feridas, vamos por mais.
Em meio aos escândalos envolvendo federações, dirigentes, jogos de apostas, ao favorecimento e o despreparo explícito da arbitragem, à invalidação de casos de racismo e misoginia, à corrupção e à transformação de clubes em sociedades anônimas de futebol (SAF); resistimos por acreditar que ainda é possível virar o jogo.
Sinto que buscamos, constantemente, manter vivo o que, lá atrás, fez desse esporte, paixão nacional. Isso enquanto assistimos, diariamente, ao desgaste e a desfiguração que acometem clubes e torcedores. Aqui destaco aqueles localizados fora do eixo, afinal, chega a ser escandaloso o favorecimento e a manipulação midiática em benefício das equipes sudestinas.
Largando um pouco esse osso, que já até cansei de roer, e deixando o clubismo em segundo plano - ainda que com certa dificuldade - vejo que talvez já tenha ado da hora de entender que, do lado de cá, estamos todos na mesma: visivelmente prejudicados.
E que baita cenário é esse, de rivalidade, para a indústria. Afinal, se o fato do rival ser afetado faz com que eu comemore ao invés de questionar a estrutura, a arbitragem, os dirigentes e a federação, amanhã ou depois, a chance do meu clube ser prejudicado e não dar em nada, mais uma vez, é grande.
Não me entendam mal, a última coisa que penso é em deixar a corneta de lado, jamais. A questão é que, enquanto insistirmos na divergência e, principalmente, alimentarmos a intolerância, desconsiderando as possibilidades de diálogo e manifestação, seguiremos peleando sozinhos contra uma questão comum.
No ano ado, diante de um dos cenários mais difíceis que o Rio Grande do Sul já enfrentou, Inter e Grêmio uniram forças. Presenciamos algo inédito, a capacidade que temos de juntos fazer a diferença. Relembro esse período não à nível de comparação, é claro, mas sim na intenção de destacar que, como afirmou Hemingway, ‘quem esteve nas trincheiras ao nosso lado importa mais do que a própria guerra’.
E estivemos lado a lado, sem sequer deixar de representar a maior rivalidade desse país, isso é fato. Afinal, nada mais justo que competir dentro das mesmas condições e virar o jogo contra a injustiça.